- Depende - responde o português.
- O senhor já alguma vez desmaiou, Doutor?- Sim.
- Eu gostava muito de desmaiar. Não queria morrer sem desmaiar.O desmaio é uma morte preguiçosa, um falecimento de duração temporária. O português que facilitasse uma escapadela dessas, uma breve perda de sentidos.
- Me receite um remédio para eu desmaiar.
O português ri-se. Também a ele lhe apetecia uma intermitente ilucidez, uma pausa na obrigação de existir.
- Uma marretada na cabeça é a única coisa que me ocorre.
Riem-se. Rir junto é melhor que falar a mesma língua. Ou talvez o riso seja uma língua anterior que fomos perdendo à medida que o mundo foi deixando de ser nosso.
in "Venenos de Deus, Remédios do Diabo", by Mia Couto
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P.S: Sou a campeã dos desmaios. Há dias, falava com a L. que me perguntou: o que são desmaios? Eu disse: acho que é quando perdes os sentidos. Acabamos a rir. Se dissecarmos bem o significado das palavras, o que é afinal perder os sentidos?
O modo como o riso é encarado nesta passagem também me cativou. Rir e gargalhar até doer a barriga são o meu passatempo preferido.
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